Surto de hanseníase afeta presos em pelo menos dois blocos da PCE Unidade de Segurança; Depen confirma diagnóstico

Falta de tratamento e de materiais de higiene podem agravar situação da doença conhecida como lepra

A hanseníase, conhecida como lepra, foi diagnosticada entre presos da Penitenciária Central do Estado Unidade de Segurança (antiga PCE II), em Piraquara, na Região Metropolitana de Curitiba. Familiares de presos afirmam que são dezenas de casos nos blocos 3 e 5 da unidade.

O Departamento de Polícia Penal (Depen), em resposta ao deputado estadual Renato Freitas (PT-PR), afirmou que o primeiro registro da doença ocorreu há 30 dias. 

Segundo o Depen, um paciente foi transferido e tratado no Complexo Médico Penal, em Pinhais. Outros casos suspeitos teriam testado negativo. A Polícia Penal ficou de repassar mais dados nesta terça-feira (27), após checagem junto à direção da PCE US. 

Com a confirmação da doença, a falta de materiais de higiene também preocupa. A situação foi confirmada pela integrante da Ordem dos Advogados do Brasil Seção Paraná (OAB-PR), Caroline Mattar Assad, em vistoria na última quinta-feira (22). 

“Sem o devido cuidado, sem que haja tratamento adequado aos presos e ambiente limpo, o surto pode se tornar mais grave e ultrapassar os muros da penitenciária. A doença que foi erradicada nos Estados Unidos e na Europa ameaça prosperar no Paraná por falta de política pública de saúde e segurança”, disse Renato Freitas. 

A Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp) e a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) ainda não se manifestaram sobre o surto.  

 

Transmissão 

A hanseníase, também conhecida como Lepra, acomete pessoas de ambos os sexos e de qualquer idade. Entretanto, é necessário um longo período de exposição à bactéria, sendo que apenas uma pequena parcela da população infectada realmente adoece. As lesões neurais decorrentes conferem à doença um alto poder de gerar deficiências físicas e configuram-se como principal responsável pelo estigma e discriminação às pessoas acometidas pela doença.

A transmissão ocorre quando uma pessoa com hanseníase, na forma infectante da doença, sem tratamento, elimina o bacilo para o meio exterior, infectando outras pessoas suscetíveis, ou seja, com maior probabilidade de adoecer. A forma de eliminação do bacilo pelo doente são as vias aéreas superiores (por meio do espirro, tosse ou fala), e não pelos objetos utilizados pelo paciente. Também é necessário um contato próximo e prolongado. Os doentes com poucos bacilos – paucibacilares (PB) – não são considerados importantes fontes de transmissão da doença, devido à baixa carga bacilar.

Não se transmite a hanseníase pelo abraço, compartilhamentos de pratos, talheres, roupas de cama e outros objetos. Já as pessoas com muitos bacilos – multibacilares (MB) – constituem o grupo contagiante, mantendo-se como fonte de infecção enquanto o tratamento específico não for iniciado. A hanseníase apresenta longo período de incubação, ou seja, o tempo em que os sinais e sintomas se manifestam desde a infecção. Geralmente, esse período dura em média de dois a sete anos; porém, há referências a períodos inferiores a dois e superiores a dez anos.

 

Tortura 

A situação da PCE Unidade de Segurança é ainda mais grave se somadas as denúncias de tortura e más condições de outros presos em condição pós-cirúrgica.  

No dia 20 de maio, como integrante da Comissão de Pessoas Privadas de Liberdade, a advogada Carolina Mattar Assad foi até a unidade prisional verificar uma denúncia de tortura. Ela foi impedida de realizar vistoria, contrariando prerrogativa. 

A denúncia recebida envolvia os Blocos 3 e 4, onde o diretor Olival Monteira estaria aplicando sanções coletivas com o intuito de “disciplinar”. Essas punições, classificadas como tortura contra população privada de liberdade, contrariam também a Lei de Execução Penal. 

No dia 21 de maio de 2025 a advogada retornou e só conseguiu conversar com detentos da faxina, selecionados pela direção. 

Porém, um dos presos, coincidentemente, se apresentou como irmão de sangue do detento que engoliu um celular e teve que fazer uma cirurgia de remoção. A atitude do preso resultou em uma das sanções “disciplinares” coletiva aplicada pela direção do presídio. 

Segundo relato, o detento D.G. retornou de cirurgia e foi direto paro o “castigo”, mesmo em condições de pós-operatório. 

Outra denúncia relata que uma briga entre detentos em fevereiro de 2025 teria “causado” sanções coletivas desde o episódio até o momento. 

O deputado Renato Freitas está organizando uma vistoria, conforme prerrogativa, com participação do presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, Professor Lemos (PT-PR). 

Renato também deve pedir acionamento do gabinete de crise do GMF (Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas do Tribunal de Justiça).

Juntos com a Comissão de Igualdade Racial, Renato deve solicitar a transferência imediata do detento Deverson Geovani de Oliveira Lima ao CMP; acesso a relatório da OAB; requerimento pela Alep às secretarias, Depen e Sesa; e formar comissão de urgência para vistoria, com TJPR, MPPR, OAB PR , Alep, Conselho da Comunidade e demais entidades e verificar as denúncias.

 

CNJ recebeu denúncia sobre violações de direitos no complexo penal de Piraquara

O deputado estadual Renato Freitas (PT-PR) fez uma denúncia junto ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), na qual aponta uma série de violações dos direitos humanos ocorridos na PCE-II, em Piraquara. De acordo com o documento, até mesmo familiares estão sendo vítimas da violência dos agentes de segurança.

O ofício foi enviado no último dia 19 de maio e aponta que familiares – em sua maioria mulheres – estão com medo de visitar os apenados. 

No dia 18 de maio, quando se celebrou Dia das Mães na unidade, familiares teriam sido expulsas com tiros de bala de borracha disparados pela Polícia Penal. 

O grupo de mães explicou que teve medo de denunciar antes porque os presos estão sendo torturados há pelo menos duas semanas e que uma reclamação externa poderia piorar a condição deles. 

A situação começou quando um preso pediu socorro a familiares há duas semanas, na visita ao Pátio da unidade.

“Pediram ajuda, dizendo que a SOE (Setor de Operações e Escolta) e os agentes ‘deram o bote’. Recolheram cobertas, cuecas, meias, tudo deles. Até produtos de higiene. Deixaram eles sem nada. Já estão sem roupa e nem cobertor por cinco dias”, conta uma familiar. 

Segundo os relatos, a violência carcerária está escalando, com abusos mais frequentes no uso de disparos de balas de borracha e spray de pimenta. No último fim de semana, os presos teriam sido obrigados a permanecer sentados no chão amontoados, usando apenas cuecas, por mais de quatro horas. 

“Voltou a acontecer o que acontecia no ano passado. Estava assim. Tiraram coberta nos dias frios, tudo de novo”, diz outra familiar. 

Testemunhas afirmaram que as ações de opressão estão mais graves no Bloco 4. “Teve um agente que entrou lá pra dentro armado, antes da visita – eles bateram o sinal da visita antes das 15h – e aquele agente entrou com aquela Calibre 12 enorme gritando com as visitas, xingando, e não respeita nem as pessoas idosas”, conta. 

Outra familiar conta que, só na última semana, os agentes entraram cinco vezes no Bloco 4 exclusivamente para disparar balas de borracha e spray de pimenta contra os presos. 

As incursões estariam ocorrendo até mesmo durante a noite. 

Entre as falas desesperadas de diversas mães, uma disse que a direção da penitenciária retira direito dos presos, como acesso aos estudos, e que o governador Ratinho Junior “deu carta branca” para este cenário de violação dos direitos humanos, tendo resultado na escalada das agressões.

“Ontem, na visita, a gente teve que sair antes do horário. Antes disso, os meninos saíram só de calça, sem camiseta, sem meia, sem blusa, sem nada. Meu filho estava muito gelado”, disse. 

O detento disse que um “castigo” está em curso. “Eles tiraram, porque a galeria 3 está de castigo, e todo mundo está pagando o castigo junto”, disse o preso à própria mãe. 

Foi nesse momento que um preso se rebelou, pediu atenção das visitas. “Pediu socorro!”, desabafa uma das mães. 

O preso denunciou que as mantas, roupas, pasta de dentes e todos os pertences foram retirados pela Polícia Penal e pelo SOE. Os kits de limpeza deixaram de ser fornecidos. 

Na saída do horário de visitas, que terminou mais cedo, um agente se dirigiu rapidamente para cima dos familiares dos detentos gritando “sai, sai, sai”. “Eu entrei em choque por causa da arma. Vi que ele foi pra cima de uma mulher que disse que era ‘falta de respeito’. Ele mirou a arma pra ela e disparou. Aí começou uma gritaria e gente correndo pra todo lado, os agentes que estavam na frente, correram pra trás”, detalhou a familiar. 

“De todos esses anos que visito o presídio, esse foi o pior dia da minha vida. E foi no Dia das Mães”, concluiu a mulher.

No corredor da saída, depois do fim da visita, as familiares contam que a violência continuou. Uma mulher teria sido agredida com uma coronhada, momento em que todas as pessoas começaram a gritar. Os presos ficaram agitados, sem saber o que acontecia com as familiares do lado de fora. 

Não há autorização vigente para que os familiares possam levar mantas ou cobertores para os presos na Penitenciária Central do Estado II Unidade de Segurança. 

Somente no dia de visita das crianças é que os menores podem portar “uma manta ou cobertor infantil”, como consta na Portaria 114/2023. 

Outras unidades prisionais do Estado mantêm portarias autorizando a entrada de roupas de frio e cobertores nesta época do ano. 

 

Providências 

O deputado estadual Renato Freitas (PT-PR) enviou na segunda-feira (19) ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) denúncia de violações de direitos humanos ocorridas nas dependências da Penitenciária Central do Estado II (PCE-II) Unidade de Segurança, em Piraquara, na Região Metropolitana de Curitiba. 

Em ofício, Freitas destacou que a violência institucional ultrapassa a praticada contra os presos e chegou a seus familiares. 

“Durante o período diurno e noturno, os reclusos estão sofrendo punições excessivas, incluindo-se a restrição de acesso ao material básico de higiene, de vestuário e de cobertores, o que está comprometendo a sobrevivência básica digna dentro do estabelecimento prisional. Além disso, foi denunciado o uso injustificado de métodos de controle em massa, como spray de pimenta e de pistolas de pressão com munição de borracha”, diz o documento.

O documento aponta ainda que os familiares “no momento da realização da visita semanal, estão sendo vítimas de represálias, destacando-se o ocorrido na data de 18 de maio de 2025, noticiando-se inclusive o não cumprimento do horário integral do período de visitas”, diz.

Na denúncia, o deputado anexou áudios e vídeos feitos por familiares dos detentos que comprovam parcela da violência sofrida pela comunidade carcerária.

“Os familiares estão com medo de visitar os presos. Sem os cobertores, alimentos e itens de higiene que foram recolhidos pelos agentes, as famílias são o último recurso dos presos para sobreviver. A tortura é muito grave e não vamos aceitar que continue. Os responsáveis precisam ser punidos”, comenta Renato Freitas.

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Brunna